quinta-feira, 31 de julho de 2008

A Agulha e o Anormal

Sou o bobo subtraído, pequeno e oculto. E sou melhor em actos do que em formas. Tenho esta tendência de acumular adjectivos e etceteras. Gostava de inventar novas palavras para o meu jogo atingir picos mais significativos. Apaixonei-me. Ontem e hoje. Talvez agora e amanhã. Por símbolos práticos, viciantes e esquisitos. Tudo no corpo de uma menina autista. O que eu não dava por uma mulher autista. De certo modo sou como a bala de um assassino. Estática e sorridente. Sou a maquilhagem usada de um palhaço arquitectónico. Dava a minha alma por uma conversa com a agulha e o anormal. E já me conheço, sei quem sou, sou o que me dizem. Vou estrinçar esses vómitos compulsivos que acabei de palavrear. Sou, sou, sou e pronto. Defino-me.

*

Eu de novo. Tenho um martelo bem dentro totalmente dentro, enterrado no meu interior. Continuo bobo. Bobo como a paisagem esta que saudável oscila. Ela não se move tanto como eu. E eu derrubo doses salgadas tanto por ela como por mim. Inquieto-me na sombra do cogumelo penetrante. Desiludo espíritos de igrejas a preto e branco. Adquiro um nome místico. Kareltje ou outro talvez. Ainda sei, ainda injecto, ainda vejo, ainda prometo. Os objectos não se importam de ser utilizados. Vou morder máscaras com ferrugem que ninguém se importa. Como sou, estreito e singelo, decido a forma que as nuvens adoptam. É uma das características que recebi pela minha exibição contínua.

*

Não sei se sou bobo, mas chamam-me de bobo. Devo ser bobo, é o nome que me dizem. Mas o meu nome não é esse, é outro.
Mas gosto do conforto da definição.
Mas sou bobo, em parte.
Mas que resolve um nome ou outro?
Sou aquele, o que me dizem e o que sou. O que faço e o que me fazem. Estou por aí e por aqui. Fui a alguns sítios e passei por outros. Já estive em toda a parte e em todo o lado. Tenho frio e tenho fome, calor e vontade. Tenho pernas e braços, olhos e bocas. Fiz tudo e nada, o meio e o esquerdo. Tenho dentes lindos, tenho dentes feios. Subi montanhas, lambi o arco-íris. Decorei um monólogo inteiro e sentei-me no público. Dei um beijo claro a todas as pessoas que não vi. Adormeci com um demónio no pescoço e rodei um filme misterioso. Vesti-me de boneca medieval e segui diamantes até casa. Voltei a juntar-me à agulha e ao anormal. Formamos a tríade perfeita, somos artefactos com licença imediata para a criação.
Qualificados para matar com um desejo telepático.
E viciados na desvalorização dos remorsos.