domingo, 5 de setembro de 2010

O Homem que Falava com Ruivas

E estava a ver televisão a debater-se consigo sobre nada a perguntar-se porque jantava sozinho no restaurante mais mediano dos arredores. Casaquinho roxo, t-shirt rosa, cheiro de mini-pizza a invadir-lhe as narinas. Preferia camarão, mas não ousava que esse pensamento o chateasse. Não era feio, apenas não tinha ninguém a quem recorrer. Seria amigo de uma criança se não fosse socialmente estranho.

A observar conversas tinha-se tornado imune à estupidez. Nada o chocava, nada o transtornava, nada o irritava, nenhuma voz ou entoação o incomodava.

Até ter começado a falar com ruivas.

Fixe!

Deus lia o jornal, lembrava-se do tempo em que trabalhara num talho, sempre o melhor empregado. Atormentava-se com o facto de ser dolorosamente atencioso. Expunha-se demasiado. Decidiu marcar uma posição. Algo severo mas subtil. Algo complicado de pensar.

"Preciso de algum tempo a sós na nuvem-trampolim."

Ar fresco. Salto mortal. Ar fresquinho. Dois pássaros passam. Salto duplo mortal. Ar espiritual. Brisa. Salto triplo mortal.

"JÁ SEI! SEMPRE QUE ALGUÉM ESPIRRAR, A SUA CABEÇA EXPLODE!"
Foi uma daquelas sensações completamente explicáveis. Falámos e BANG. Deu-se. Devia ser isto o amor, ou pelo menos o romance sem tragédia. Ela tinha tudo que eu desejava em alguém: coisas. Até a falar de suicídio era apaixonável.
- Amo-te.
- Amo-te.
- Amo-te.
- Amo-te.
O vício contínuo enjoativo semelhante a um iogurte fora do prazo de morango acentuado. Irrespirável e claustrofóbico perfeito.