quinta-feira, 8 de maio de 2008

Éplicas


- Ultimamente estás frio comigo ...

- É natural, não gosto de ti.

- Não me gozes...

- A sério, não te curto.

- Oh, estás parvo...

- Vai mas é fazer-me o jantar.

- O que é que tu queres?

- Sei lá... algo com massa.

- Está bem.

- E salsichas.

- Ok, pronto.

- E rápido.

- Deves pensar que o mundo gira em teu redor...

- Vai-te foder. E diz-se "gira à tua volta", não "em teu redor". Às vezes não te percebo, pareces estúpida.

- Pareço mas não sou.

- Acredita. És estúpida.

- Pára de dizer isso...

- O quê? A palavra "estúpida" incomoda-te? A realidade atinge-te?

- Já me começas a enervar...

-Estás enervada...essa é boa...estás enervada. E eu? Como achas que me sinto por viver com uma retardada? Diz-me...quando foi a última vez que leste um livro?

- Não venhas com essas tretas... sabes bem que isso tudo da inteligência é muito subrejectivo...

- Muito quê? Muito quê? Desculpa? É que acho que não te ouvi bem...

- Então?! Eu disse que a inteligência é muito subre...

- Lindo! Subrejectiva! Foi isso mesmo! Retiro o que disse! És um génio! Até inventas palavras!

- Olha... dizes mais uma boca dessas e eu zango-me. Zango-me mesmo!

- Ok, ok, acalma-te.

(...)

- Vaca...

- O quê?

- Hey! É apenas um facto! Negas que és uma grande vaca? Negas, negas por acaso?

- Olha, continuas com essas coisas e eu não te perdoo. Eu juro que não te perdoo.

- Puta! É o que tu és! És uma puta! Odeio-te! Como já te disse, acho-te sinceramente estúpida. Só estou a viver contigo porque não me apetece arranjar trabalho, és feia, a decoração aqui é horrível, as cortinas não combinam, não sabes cozinhar, não gosto dos teus pés, ouves música parva do Tibete, não sabes fazer amor, comes tostas mistas sem queijo, apanhas mocas de incenso, és gorda, maquilhada pareces um palhaço, os teus dentes assobiam de forma estranha, exageras nas mini-saias, e deves achar que o William Shakespeare é o melhor marcador da liga inglesa!

- Achas mesmo isso tudo?

- Ah, e odeio a forma como bebes leite directamente do pacote. É nojento.

- Oh, estás a ser estúpido...não sabes o que dizes.

- Ah, mas sei! Claro que sei! Tudo isto é absolutamente verdade! Dogmas, percebes? Estou a lançar-te dogmas!

- Estás muito convencido hoje. Devias descansar um pouco.

- Tu não percebes nada mesmo! Repara...vou sair...e nunca mais me vais ver! Acabámos! Puf! Que tal, ahn? Finalmente! Estou livre, estou livre...posso fazer tudo o que quiser a partir de agora. Tudo. Até nunca!

- Até logo, fecha bem a porta. Ah, e olha...não te esqueças de trazer leite quando vieres.

Um comentário:

Anônimo disse...

Genial, adoro este diálogo travado entre duas pessoas que nitidamente não falam a mesma linguagem, mas que conseguem comunicar!?
o amor é uma coisa mesmo estranha. A rapariga parece uma tonta, que apenas consegue alcançar o maravilhoso sonhado; o rapaz por sua vez parece um adolescente fechado no seu egocentrismo, com muito pouco que partilhar. ~
Ai Deus, a nossa sociedade está perdida, as pessoas falam palavras mas não comunicam
Ass: Alfaces